Maria Madalena - BRASIL ESCOLA |
Ao contrário das várias outras Marias que aparecem na Bíblia, Madalena não tem seu nome vinculado a um marido ou pai. Contudo, o seu sobrenome, pode também remeter à prospera cidade comercial de Migdal, onde ela supostamente teria nascido. Ainda hoje, é possível encontrar um antigo letreiro nas ruinas dessa cidade que descreve essa enigmática mulher como uma serva de Cristo.
Paralelamente, o termo “Madalena” significa “torre” em aramaico. Em termos simbólicos, a torre é um lugar privilegiado, do qual se pode ter uma visão mais ampla das coisas. Coincidentemente, ela é a personagem da narrativa bíblica que percebe inicialmente que a sepultura de Cristo estava vazia ao terceiro dia. Em certa medida, essa primeira percepção salienta toda uma discussão que pretende circunscrever qual o papel dela na história do cristianismo.
Mais que uma humana arrependida, ela se coloca deste modo como uma mulher completamente redimida e livre de qualquer espécie de pecado. Contudo, se existia a possibilidade dessa interpretação ter sido consolidada, ela acabou desaparecendo quando o papa Gregório Magno (540 - 604) e, seguidamente, os textos da Inquisição tiveram a função de colocá-la na vacilante posição de uma mulher que caminhou entre os tênues limites da salvação e do pecado.
Após a ascensão de Cristo, a imagem de Maria Madalena desaparece como a de uma mulher que não mais teria utilidade. Contudo, em uma passagem no livro de Romanos, o apóstolo Paulo salienta que, entre várias pregadoras do cristianismo, Maria teria feito “muito por vós”. Mesmo não especificando que Maria seria essa, vale lembrar que Madalena teria grandes possibilidades de atuar como pregadora na condição de mulher livre do matrimônio e nascida em uma movimentada cidade comercial.
Por meio desses indícios, a suposta veracidade dos textos apócrifos – especialmente do Evangelho de Felipe – ganham uma proporção incendiária. A dimensão de uma mulher livre e independente se potencializa com a figura da mais próxima seguidora de Cristo, que teria por ela um amor de dimensões carnal e espiritual. Apesar de polêmica e ativadora de várias interpretações atraentes, os indícios históricos não são suficientes para que ela seja firmada como a “esposa de Cristo”.
Devemos salientar que os textos apócrifos que sugerem o contato íntimo entre Cristo e Madalena também podem estar fazendo uma construção simbólica. As manifestações do corpo são comumente utilizadas como alegorias que exprimem a consumação de uma experiência espiritual superior. A própria descrição bíblica que relata que Jesus suou sangue pode, por exemplo, representar a agitação do Messias ao reconhecer a proximidade de seu destino no mundo.
Mediante a precariedade de um veredicto, vemos que a fragmentação de Madalena em outras imagens expõe a vivacidade que a experiência religiosa pode ter em nosso cotidiano. De um lado, a construção de uma Maria Madalena mais positiva reforça o valor cristão que há muito tempo salienta que “os últimos serão os primeiros”. Por outro, essa mesma imagem pode saciar as questões de um tempo presente, onde as mulheres ganham outro lugar na sociedade e a autoridade clerical já não é mais a mesma.
Por Rainer Sousa
Graduado em História
Equipe Brasil Escola
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